DIFICULDADES ENFRENTADAS POR CUIDADORES DE ADULTOS E IDOSOS INSTITUCIONALIZADOS DURANTE A PANDEMIA DE COVID-19
DIFFICULTIES FACED BY CAREGIVERS OF INSTITUTIONALIZED ADULTS AND ELDERLY DURING THE COVID-19 PANDEMIC
DIFICULTADES ENFRENTADAS POR CUIDADORES DE ADULTOS Y ANCIANOS INSTITUCIONALIZADOS DURANTE LA PANDEMIA DE COVID-19
Tipo de artigo: Estudo qualitativo
Autores
Karen Cristiny Dias Lourenço
Enfermeira.
Orcid: https://orcid.org/0000-0001-8180-311X
Jordana Alves de Aguiar
Enfermeira. Mestre em Gestão Organizacional (UFCAT). Instituto de Biotecnologia
Orcid: https://orcid.org/0000-0003-4640-2198
Andreia David De Oliveira
Enfermeira. Mestre em Gestão Organizacional (UFCAT).
Orcid: https://orcid.org/0000-0001-5423-1590
Kamylla Guedes de Sena
Enfermeira. Mestre em Gestão Organizacional (UFCAT). Doutoranda em Medicina Tropical e Saúde Pública, no Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública (IPTSP).
Orcid: https://orcid.org/0000-0001-8345-9981
Nunila Ferreira de Oliveira
Enfermeira. Doutorado em Ciências. Professora Adjunta – Departamento Enfermagem da Universidade Federal de Catalão (UFCAT). Instituto de Biotecnologia.
Orcid: https://orcid.org/0000-0002-1628-5181
Brenda Souza Nery
Graduanda em Enfermagem. Departamento Enfermagem da Universidade Federal de Catalão (UFCAT). Instituto de Biotecnologia.
Orcid: https://orcid.org/0009-0006-5090-6398
Carol Macêdo Silva Franca
Graduanda em Enfermagem. Departamento Enfermagem da Universidade Federal de Catalão (UFCAT). Instituto de Biotecnologia.
Orcid: https://orcid.org/0009-0005-2124-6207
Ivânia Vera*
Enfermeira. Doutora em Enfermagem – Ênfase em Saúde do Idoso. Orientadora no Programa de Mestrado em Gestão Organizacional (PPGGO). Universidade Federal de Catalão (UFCAT)
Orcid: https://orcid.org/0000-0002-8974-7949
RESUMO
Objetivo: Descrever a percepção de cuidadores de adultos e idosos institucionalizados quanto às dificuldades no trabalho durante a pandemia de COVID-19. Método: Pesquisa qualitativa descritiva realizada em ILPIs de três cidades do sudeste goiano, com entrevistas em profundidade de setembro a dezembro de 2021. A apreciação seguiu etapas de análise temática de conteúdo e foi complementada pelo software IRAMUTEQ. Resultados: Os maiores desafios incluíram o enfrentamento do medo, isolamento social e aumento das incapacidades dos moradores. No entanto, destacaram-se pontos facilitadores, como o reconhecimento da importância do profissional cuidador e a valorização da capacidade de manter um cuidado eficaz, garantindo o funcionamento das ILPIs apesar das limitações impostas pela pandemia. Conclusão: A pandemia revelou desafios para cuidadores e moradores de ILPIs, como medo e sensação de abandono. A perseverança dos cuidadores permitiu a continuidade do cuidado, englobando aspectos físicos, emocionais e espirituais, destacando a necessidade de capacitação e apoio para melhorar os cuidados.
DESCRITORES: Saúde do idoso institucionalizado; Cuidadores; Instituição de Longa Permanência para Idosos.
ABSTRACT
Objective: To describe the perception of caregivers of institutionalized adults and elderly regarding the work difficulties faced during the COVID-19 pandemic. Method: A descriptive qualitative research conducted in long-term care institutions (LTCIs) in three cities of southeastern Goiás, with in-depth interviews conducted from September to December 2021. The apreciattion followed the stages of thematic content analysis and was further complemented by the IRAMUTEQ software. Results: The main challenges included facing fear, social isolation, and increased levels of incapacity of the residents. However, facilitating factors were also found, such as the recognition of the importance of the caregiver professional, the perception and appreciation of the ability to maintain effective care, and the continued operation of LTCIs despite the limitations imposed by the pandemic. Conclusion: The pandemic exposed challenges for caregivers and residents of LTCIs, such as fear and feelings of abandonment. However, the perseverance of caregivers ensured the continuity of quality care, encompassing physical, emotional, and spiritual aspects, highlighting the need for training and support to improve care.
DESCRIPTORS: Institutionalized elderly health; Caregivers; Long-Term Care Institution for the Elderly.
RESUMEN
Objetivo: Describir la percepción de los cuidadores de adultos y personas mayores institucionalizados sobre las dificultades laborales enfrentadas durante la pandemia de COVID-19. Método: Investigación cualitativa descriptiva realizada en instituciones de atención a largo plazo (ILPI) en tres ciudades del sureste de Goiás, con entrevistas en profundidad realizadas entre septiembre y diciembre de 2021. El apreciación siguió las etapas del análisis temático de contenido y fue complementado con el software IRAMUTEQ. Resultados: Los principales desafíos incluyeron enfrentar el miedo, el aislamiento social y el aumento de las incapacidades de los residentes. Sin embargo, también se identificaron factores facilitadores, como el reconocimiento de la importancia del profesional cuidador, la percepción y valorización de la capacidad para mantener una atención efectiva y la operación continua de las ILPIs a pesar de las limitaciones impuestas por la pandemia. Conclusión: La pandemia expuso desafíos para los cuidadores y residentes de las ILPIs, como el miedo y la sensación de abandono. Sin embargo, la perseverancia de los cuidadores garantizó la continuidad de una atención de calidad, abarcando aspectos físicos, emocionales y espirituales, destacando la necesidad de capacitación y apoyo para mejorar la atención.
DESCRIPTORES: Salud del adulto mayor institucionalizado; Cuidadores; Institución de Larga Estadía para Personas Mayores.
INTRODUÇÃO
O fenômeno do envelhecimento da população mundial é inegável. Nas próximas décadas, esse processo ocorrerá em ritmo acelerado em países que, assim como o Brasil, estão em fase de desenvolvimento. A diminuição das taxas de mortalidade e fecundidade são entendidas como conquista para a maioria da população, porém, para as pessoas que se encontram em situação de vulnerabilidade social isso pode refletir de forma completamente negativa, uma vez que a presença de fragilidades dificulta a garantia na manutenção da saúde das pessoas idosas em domicílio pela sua própria família (1).
Por meio dessa dificuldade encontrada, uma das alternativas para o cuidado da pessoa idosa é a busca por instituições do tipo asilares, conhecidas também como Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPI). Estes são locais de domicílio coletivo de pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, que possuem ou não um suporte familiar (2).
Com a pandemia da Coronavirus Disease 2019 (COVID-19) houve um impacto sob vários aspectos na população em geral, sobretudo as pessoas idosas institucionalizadas, devido à sua alta transmissibilidade e à carência de conhecimentos acerca do novo vírus, o que acarretou aumento dos casos de adoecimento físico, mental, além de impedir que a população adulta e idosa desenvolvesse suas atividades coletivas e laborais e, a prática das atividades virtuais, com vistas a proteção do morador e funcionários de ILPI, contribuiu para o declínio do estresse provocado pelo isolamento social (3).
Os fatores associados a tal cenário afetaram, em especial, os cuidadores domiciliares que relataram sobrecarga de trabalho, estresse maior que o habitual, esgotamento mental, além de sintomas físicos como cefaleia, mialgia e desconforto abdominal. Essa situação comprometeu a efetividade do cuidado e afetou diretamente a segurança das pessoas idosas no âmbito domiciliar, maximizando as chances da necessidade de cuidados hospitalares ou em ILPI (4).
A fim de analisar os números de óbitos por COVID-19 na população idosa, um estudo evidenciou que cerca de 44,7% dos óbitos registrados em decorrência da COVID-19 na população em geral seriam provenientes das ILPI, destacando-se a região sudeste por apresentar maior prevalência de mortes, totalizando 48.779 destes, seguida pela região nordeste, onde registrou-se 28.451 mil óbitos (5).
Nesse viés, no contexto epidemiológico da pandemia, a prestação de cuidados sofreu interferências diretas, acarretando consequências negativas sobre a saúde física e mental dos profissionais cuidadores, familiares e pessoas idosas. Diante disso, a criação de movimentos sociais que buscou orientar os cuidados prestados nas instituições durante a pandemia indicou a necessidade de capacitações voltadas à equipe dos cuidadores para melhor garantia do cuidado prestado (6).
Tendo em vista a relevância do tema acerca da percepção de cuidadores de adultos e pessoas idosas institucionalizadas frente a pandemia, justifica-se esse estudo na tentativa de conhecer as dificuldades enfrentadas por esses trabalhadores nas ILPI durante a pandemia da COVID-19. Apresenta-se como pressuposto: os cuidadores de adultos e pessoas idosas de ILPI descreveram dificuldades relacionadas ao trabalho durante a pandemia da COVID-19? Quais seriam elas? Partindo desse questionamento, o objetivo desse estudo foi descrever a percepção de cuidadores de adultos e pessoas idosas institucionalizadas quanto às dificuldades enfrentadas no trabalho durante a pandemia da COVID-19.
MÉTODO
Trata-se de um estudo transversal com abordagem qualitativa (7) de caráter descritivo, realizado com cuidadores pessoas adultas e idosas institucionalizadas de municípios do sudeste goiano. O presente estudo foi orientado pelas diretrizes do Consolidated Criteria for Reporting Qualitative Research (COREQ) (8).
Os participantes convidados para a pesquisa foram cuidadores de moradores de ILPIs presentes em três dos 18 municípios que fazem parte da Regional Estrada de Ferro, da região Sudeste do estado de Goiás. O convite para a coleta de dados foi conduzido conforme conveniência, intencionalidade e de acordo com a disponibilidade dos mesmos (9).
Inicialmente foram feitos contatos telefônicos junto às ILPIs, para averiguar o melhor dia e horário para apresentar a proposta da pesquisa, explanar sobre os preceitos éticos e recolher, de modo presencial, a assinatura nos Termos de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
Para a participação da pesquisa foram convidados todos os 19 cuidadores das três ILPIs. Após serem esclarecidos os objetivos e dúvidas por parte dos potenciais participantes de pesquisa, 14 cuidadores assinaram o TCLE, contando com 5 recusas.
A entrevista de modo remoto foi conduzida por enfermeiras pesquisadoras, com experiência em coleta de dados em pesquisas que envolvem a temática do cuidado às pessoas idosas, após relacionamento estabelecido antes do estudo, em dia e horário definido previamente pelos cuidadores, de modo a não interferir na atividade laboral e/ou em seu domicílio, sendo orientado que o local fosse privativo, sem a presença de outros pessoas. Os participantes foram orientados quanto aos aspectos gerais da pesquisa (objetivos e razões), com oportunidade de esclarecimento de suas dúvidas. A duração média das entrevistas foi de aproximadamente 30 minutos.
A coleta de dados ocorreu no período entre setembro a dezembro de 2021, utilizando-se da ferramenta Google forms e pela plataforma de videoconferência Google meet (ambas desenvolvidas e disponibilizadas gratuitamente pelo Google). As entrevistas foram gravadas (áudio e vídeo), transcritas na íntegra e processadas no software Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires (IRAMUTEQ) (10).
Os critérios de inclusão foram: ser cuidador de adulto ou pessoas idosas nas ILPIs participantes da pesquisa com idade maior ou igual a 18 anos com qualquer tempo de atividade laboral. Foram excluídos aquelas pessoas que cuidam, mas que não exercem naquele local a atividade laboral como cuidadores e os que estavam afastados e/ou em período de férias.
Os dados foram coletados por meio de um instrumento com questões sociodemográficas desenvolvido pelas pesquisadoras e a questão disparadora foi: “Relate quais dificuldades você encontrou no seu trabalho durante a pandemia da COVID-19”.
Após a transcrição das entrevistas, foi realizada análise preliminar por leitura em profundidade. A análise foi realizada de forma dedutiva, inicialmente seguindo-se as etapas da análise temática de conteúdo (7) e, posteriormente, conduziu-se análise complementar por meio do software IRAMUTEQ, permitindo a aplicação de cálculos estatísticos aos dados qualitativos (10).
Um teste piloto foi realizado com 10 (dez) cuidadores com as mesmas características da população que participaria do estudo para avaliar o tempo da entrevista e a necessidade de ajustes na coleta dos dados e para realizar o treinamento dos pesquisadores de campo. Porém, essas informações não fizeram parte da análise final dos dados.
Para proceder à análise dos dados no software IRAMUTEQ, a fala dos participantes da pesquisa foi codificada com a denominação "Participante" seguido de um número de identificação de 01 a 14. Assim, foram adicionadas as linhas de comando, também conhecidas como "linhas de asterisco", para separar os diferentes trechos de texto. O início das linhas de comando com quatro asteriscos (****), seguidos de um espaço e mais um asterisco (*), que continham a identificação do cuidador, como exemplificado a seguir: **** *Participante_01 " (11).
Os dados processados utilizando o IRAMUTEQ e o direcionamento da análise por meio da Classificação Hierárquica Descendente (CHD) deu origem a cinco classes compostas por vocais simultâneas e análogas entre si, mas diferentes dos psicológicos das outras classes. Isso permite a análise de segmentos de texto (ST), que também foram apresentados ao longo dos resultados, além da imagem, chamada de dendrograma, como uma representação gráfica (11).
A análise direcionou a conformação de três grandes temas a partir das cinco classes: Dificuldades encontradas pelos cuidadores das ILPI durante a pandemia da COVID-19 (Classes 1 e 5), Limitações vivenciadas durante a pandemia da COVID-19 (Classe 2), e Percepções dos cuidadores quanto o distanciamento físico e alterações na rotina de trabalho durante a pandemia da COVID-19 (Classes 3 e 4).
Esta pesquisa é parte integrante de um projeto matriz, intitulado “Inquérito da situação de saúde da população adulta e idosa institucionalizada e de seus cuidadores: Gestão em Saúde, vinculada ao Grupo de Pesquisa Gestão, Enfermagem, Cuidado, Saúde e Enfermagem (GENCSE) e foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Catalão (CEP/UFCAT) com o CAAE número 40481420.4.0000.8409, e atendeu às resoluções do Conselho Nacional de Saúde 466/2012 (12) e 510/2016 (13).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Participaram da pesquisa 14 (73,6%) cuidadores de idosos trabalhadores de ILPI, em sua maioria do sexo feminino (n=13; 92,9%), que se autodeclararam raça/cor branca (n=6; 42,9%). A escolaridade de maior prevalência foi o ensino médio completo (n=8; 57,1%). Em caso de doenças, a busca pelo serviço de saúde indicado foi o Sistema Único de Saúde (SUS), o mais relatado (n=13; 92,9%).
Quanto aos aspectos subjetivos, extraídos das narrativas das entrevistas com profundidade após processado pelo IRAMUTEQ, identificou-se e aproveitou-se 35 Segmentos de Textos (ST), o que representa um total de 100% do conteúdo analisado, evidenciando eficácia amostral (14).
A Classificação Hierárquica Descendente (CHD), revelou cinco classes: três classes principais e um desdobramento secundário com outras duas classes. A figura 1 mostra o dendrograma vertical, demonstrando as formas ativas contidas nos ST associadas a cada classe. Observa-se assim, que a primeira partição do corpus deu origem à Classe 1 (representada por 11,4% do material – 4 ST); a segunda deu origem à Classe 2 (representada por 31,5% do material – 11 ST); a terceira deu origem à Classe 5 (representada por 17,1% do material – 6 ST) e, por fim, a quarta partição separou a Classe 3 (representada por 28,6% do material – 10 ST) e 4 (representada por 11,4% do material – 4 ST).
Figura 1 – Dendograma da Classificação Hierárquica Descendente. Goiás, Brasil, 2021.
Fontes: os autores.
As classes estão apresentadas na ordem que foram originadas (1, 2, 5, 3, 4). A partir das cinco classes identificadas, surgiram três grandes temas, o primeiro denominou-se “Dificuldades encontradas no trabalho pelos cuidadores das ILPI durante a pandemia da COVID-19” representando a Classe 1 e Classe 5, traz um pouco das dificuldades encontradas pelos cuidados no enfrentamento da COVID-19 nos seus locais de trabalhos, que foram abluídos por desafios de restrição de contato físico, estresse por situações vivenciadas e afloramento de sentimentos, isolamento social, reconhecimento do despreparo para o enfrentamento sobre o ‘novo vírus’, bem como o contágio e adoecimento.
[...] os cadeirantes, principalmente eles gostamos de colocar eles em pé segurando no ombro da gente, então assim, acho que a grande dificuldade mesmo é a questão do não contato físico [...] Participante 06
[...] muita das vezes cê escutava aquele chorinho... que queria dar um abraço né no filho ou alguém que vinha ali... vê então a dificuldade de vê eles triste, essa foi minha maior dificuldade... vê eles triste [...] Participante 01
[...] é ...a minha maior dificuldade foi sempre ser boazinha e nunca ficar estressada porque eles já estão estressados, aí se eu estressar também... tem que ter muita paciência [...] Participante 04
[...] eu acho que a maior dificuldade neste período de pandemia foi a questão do isolamento deles, de vê-los assim tristes né e ansiosos por não poder ter visita né ...e a questão do isolamento [...] Participante 06
[...] é... eu durante a pandemia foi mais isso mesmo... porque a gente tinha que ficar mais tempo ali com eles e a gente não tinha um preparo [...] Participante 09
[...] a maior dificuldade no trabalho foi assim lidar com as cuidadoras mesmo, lidar com a vida das cuidadoras fora do abrigo... o medo delas contraírem a doença e trazer para o abrigo nesse período [...] Participante 10
Sabe-se que, pessoas idosas institucionalizadas apresentam uma vulnerabilidade particular. Nessas instituições, é comum encontrar pessoas idosas octogenárias, com multimorbidades e grau elevado de dependência. Além disso, eles frequentemente convivem em espaços fechados, o que aumenta os desafios e cuidados necessários para garantir seu bem-estar e saúde (15).
O cuidado a pessoa idosa é uma atividade complexa e estressante. Esse fato, aliado à situação do ambiente e ao alto número de residentes sob os cuidados de um profissional, resulta em um desgaste físico, emocional e psicológico significativo. Muitas vezes, essa situação leva a um estado de esgotamento, sobrecarga de trabalho e redução da qualidade de vida do profissional que atua na assistência direta às pessoas idosas (16).
Na perspectiva do cuidado ao morador, no contexto das ILPI, o dimensionamento adequado da equipe deve levar em consideração o nível de dependência do público atendido, a saber: dependência grau I (pessoas idosas independentes, mesmo que necessitem de auxílio de dispositivos de autoajuda), deve haver um cuidador para cada vinte pessoas idosas, com carga horária de 8 horas. Para dependência grau II (pessoa idosa com dependência em até três atividades de autocuidado para a vida diária), é necessário um cuidador para cada dez pessoas idosas por turno. Para dependência grau III (pessoas idosas com dependência que requer atendimento em todas as atividades de autocuidado para a vida diária e/ou com comprometimento cognitivo), deve haver um cuidador para cada seis pessoas idosas por turno (2). Também pode-se citar a sobrecarga vinculada às mulheres trabalhadoras durante a pandemia da COVID-19, que em seus lares tinham a demanda de cuidado, apoio e suporte, além do trabalho, também cuidando e no contexto das trabalhadoras de ILPI, a particularidade do cuidado voltado para um grupo sabidamente em maior vulnerabilidade e riscos de complicações e óbito.
A pandemia do coronavírus, aflorou questões que não dependem diretamente do processo de cuidar, o corpo envelhecido favorece uma maior suscetibilidade de contraírem a infecção pelo coronavírus e desenvolverem possíveis complicações. Esse cenário trouxe aos cuidadores sentimentos de incapacidade, impotência, medo de contrair e transmitir a doença e isso se torna um fator importante na qualidade do cuidado prestado e na qualidade de vida do cuidador, representando assim, um grande desafio encontrado frente à da COVID-19 (17).
O medo de contrair a COVID-19 e provocar o contágio no contexto da ILPI também foi relatado, bem como a necessidade de ser apoio emocional nas situações de ausência das visitas dos familiares.
Representando a Classe 2, denominada “Limitações vivenciadas durante a pandemia da COVID-19”, essa classe traz os aspectos que causaram alteração do modelo de agir, frente ao isolamento social, impedimento de visitação/entrada nas ILPI, utilização obrigatória de equipamentos de proteção individual (máscara), afloramento do choro fácil do morador residente frente aos acontecimentos, na impossibilidade do abraço, além da insegurança quanto ao trabalho prestado.
[...] minha maior dificuldade foi ficar longe da minha família [...] (Participante 01).
[...] vê eles querendo ver a família deles e não poder tipo assim a família chegava ali no portão e eles ficavam bem longe da porta e eles ficavam tipo só lá na porta lá de fora com a porta fechada [...] (Participante 01).
[...] estar usando máscara o tempo todo [...] Participante 05
[...] eu acho que foi a maior dificuldade que eu encontrei porque muitos choram quando você fala ai não posso te dar um abraço [...] (Participante 06).
[...] porque querendo ou não quando a gente vai trocar uma fralda vai trocar uma roupa o interno acaba que meio que abraça a gente porque segura no ombro né pra firmar o corpo pra gente tá trocando [...] (Participante 06).
Considerando a complexidade da doença, o isolamento social foi a alternativa mais recomendada de se conter o avanço da pandemia e consequentemente a proliferação do vírus. Porém, um dos principais impactos dessa estratégia é o seu efeito nas relações interpessoais e na própria saúde das pessoas idosas, causando pioras de quadros clínicos, aumento no grau de dependência da pessoa idosa, aumento na resistência para a realização das Atividades de Vida Diárias (AVD) além de ansiedade e depressão em larga escala (18). E, ainda para os trabalhadores, a situação de permanecer distanciados das suas famílias além do medo de ser ‘ponte’ para o contágio, seja no âmbito doméstico ou no trabalho e nesse caso, com público em maior condição de vulnerabilidade (19).
A pandemia da COVID-19 causou uma série de mudanças na rotina da sociedade em todo o mundo, como o uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) em todas as circunstâncias, higienização das mãos e superfícies e o isolamento social, principalmente das pessoas consideradas grupo de risco, como as pessoas idosas. As informações se deram prioritariamente por meio remoto e isso dificultou o acesso para certas pessoas, o que acarretou uma sobrecarga ainda maior nos cuidadores, afetando muito sua saúde mental, aumentando o nível de estresse, ansiedade, depressão e Síndrome de Burnout (15).
A pandemia também instalou um desafio grande para os cuidadores de pessoas idosas, visto que a atenção precisou ser redobrada visando o cuidado continuado e de qualidade seguindo as exigências de medidas de controle e prevenção para evitar a disseminação da doença e manutenção da qualidade do envelhecimento (16).
O último tema foi nomeado “Percepções dos cuidadores quanto o distanciamento físico e alterações na rotina de trabalho durante a pandemia da COVID-19”, sendo representado pelas Classes 3 e 4, momento em que desvelou a dificuldade em manter um serviço com o distanciamento, sem a presença do toque, a demonstração do afeto pelo abraço, do carinho demonstrado por meio de abraços e beijos e a dificuldade de contornar a situação devido as regras impostas pela pandemia, como novamente, o isolamento social, da saudade que os moradores sentiram de suas famílias.
[...] porque por exemplo: eles querem abraçar a gente a gente não pode abraçar né a gente tem que, mesmo cuidando tem que ter aquele cuidado para não ficar muito perto né não pode dar um beijinho eles gostam de abraçar e gostam de beijar [...] (Participante 06).
[...] a gente não pode estar beijando é até chato pra gente ai não posso te beijar não me abraça não pode a gente até criou aqui um é nós construímos um banheiro no lado externo [...] (Participante 06).
[...] não sei... as vezes não poder ter muito contato com eles assim né ficar juntinho com eles como eles gostam muito, eles sentem muita falta disso né da gente poder tá abraçando e beijando eles [...] (Participante 11).
[...] um beijo e a gente falava: mas agora a gente não pode por causa da pandemia né pegar na mão abraçar eles gostam disso ai isso é difícil né porque eles gostam né e não tá junto com a família [...] (Participante 11).
[...] eu acho que não dificulta não ficou melhor assim não vem os visitantes as pessoas que vinham visitar os parente deles aqui acho que é isso [...] (Participante 12).
[...] não foi muito difícil a gente achou assim porque assim você era acostumado eles chegar aqui para ver eles vinha e entrava né quando era dia das mães e a filha veio ver a mãe só do lado de fora [...] (Participante 14).
Com frequência, na rotina de cuidados, a pessoa idosa que vive em ILPI desenvolve laços afetivos com os cuidadores, compartilhando experiências, intimidades, desejos e preocupações. Essa conexão se estabelece devido ao longo período de convivência e ao apoio emocional fornecido pelos profissionais, o que enfatizam a conexão dessa escuta para a construção de sentimentos positivos, essenciais para manter uma convivência amorosa e afetuosa no ambiente institucional (20).
Alguns sentimentos causam sofrimento entre os profissionais encarregados como: o fato de as pessoas idosas sentirem a ausência da família e o desinteresse dela em relação ao seu bem-estar. Esse cenário faz com que o cuidador se torne a única fonte de afeto para a pessoa idosa institucionalizada e, muitas vezes, por não conseguir suprir essa falta, o cuidador acaba sofrendo também (21).
Além da expectativa de ser apoio, provavelmente muitas das trabalhadoras estavam vivendo a necessidade de serem apoiadas, e também sentindo falta das trocas e vivências afetivas características do seu âmbito de trabalho junto aos idosos.
Outra situação frequente no dia a dia dos profissionais das ILPI é acompanhar o declínio funcional e a piora clínica das pessoas idosas. Quando o cuidado prestado não é mais capaz de manter a estabilidade da pessoa idosa, sua satisfação profissional diminui consideravelmente. Essas circunstâncias geraram consternação e desafios emocionais para os cuidadores. Fato esse muito vivenciado durante a pandemia da COVID-19 (22).
CONCLUSÃO
A pandemia da COVID-19 revelou um cenário de cuidado com muitas vulnerabilidades enfrentadas pelos cuidadores, como situações de tristeza, medo, aflição, cobrança e despreparo para cuidar desses idosos frente ao risco do adoecimento e contágio do coronavírus. Aos moradores sensação de abandono, isolamento social, restrição de demonstração de afeto (abraços, beijos, contato físico próximo) o que gerou grande consternação e sensação de tristeza.
No entanto, é notável como a força e a perseverança desses cuidadores se tornaram facilitadoras, permitindo que o serviço continuasse sendo oferecido com qualidade. Eles se preocuparam em oferecer cuidados ampliados, que englobaram aspectos físicos, emocionais e espirituais durante o tempo de cuidado.
Torna-se fundamental fornecer capacitações e criar uma rede de apoio para esses cuidadores, permitindo-lhes enfrentar essas circunstâncias difíceis com maior preparação e resiliência. Essas medidas de suporte são essenciais para garantir que as pessoas idosas recebam o cuidado adequado durante sua permanência em ILPI. O reconhecimento do cuidado e o apoio ao trabalho dos cuidadores são essenciais para garantir o bem-estar das pessoas idosas e promover a qualidade dos cuidados prestados durante momentos difíceis e adversos.
As restrições impostas pela COVID-19, indiretamente, podem ter afetado uma maior participação do cuidador de morador institucionalizado nesse estudo. Outras limitações, podem estar relacionadas a possibilidade do viés da memória do participante em relatar os fatos e/ou medo de se abrir, na perspectiva de que ‘pudessem prejudicar a ILPI’. Outro aspecto também vivenciado, foi a dificuldade em encontrar pesquisas que abordassem a temática de cuidadores de moradores de ILPI e suas dificuldades em exercer a função, sobretudo no período pandêmico.
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FINANCIAMENTO
Este estudo foi realizado com apoio oferecido por meio do Programa de Iniciação à Pesquisa Científica, Tecnológica e em Inovação (PROIP/UFCAT) sob o edital PROPESQ Nº 01/2022, da Universidade Federal de Catalão - Programa Institucional de Bolsa de Iniciação Científica (PIBIC) na modalidade Bolsista de Iniciação Científica (PIBIC) - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
AGRADECIMENTO
Aos cuidadores participantes da Pesquisa e aos membros do grupo de Pesquisa GENCSE.