FATORES ASSOCIADOS À DETERIORAÇÃO CLÍNICA EM PACIENTES ADMITIDOS NA UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA

 FACTORS ASSOCIATED WITH CLINICAL DETERIORATION IN PATIENTS ADMITTED TO THE INTENSIVE CARE UNIT

FACTORES ASOCIADOS AL DETERIORO CLÍNICO EN PACIENTES INGRESADOS EN LA UNIDAD DE CUIDADOS INTENSIVOS

Tipo de artigo: Estudo primário

Autores

Ester Pereira Silva

Enfermeira residente em Terapia Intensiva do Hospital das Clínicas de Pernambuco (HC-UFPE/EBSERH)

Orcid: 0000-0002-7735-5526

Roseane Vasconcelos Lins Gomes

Doutora em Saúde da Criança e do Adolescente e Professora Adjunta do Departamento de Enfermagem da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)

Orcid: 0000-0002-6579-8418

Tatiane Lins da Silva

Mestre em Enfermagem pela UFPE e Enfermeira especialista em Cardiologia e Terapia Intensiva

Orcid: 0000-0003-0030-1949

RESUMO

Objetivo: Avaliar os fatores associados à deterioração clínica em pacientes admitidos na UTI. Método: Estudo observacional, quantitativo, realizado em ​​120 prontuários de pacientes admitidos entre julho e outubro de 2023. Para coleta de dados, utilizou-se um instrumento de caracterização sociodemográfica e clínica e a Escala NEWS 2. Foram aplicados testes estatísticos e modelo de regressão logística, considerando significativas as associações com p<0,05. Resultados: Fatores como idade avançada (OR=6,9; IC95% 1,78-26,7), câncer (OR=2,52; IC95% 0,98-6,43), internação clínica (OR=4,08; IC95% 1,39-11,95), e desfecho de óbito (OR=16,42; IC95% 2,13-126,7) foram associados a escores elevados no NEWS 2. Conclusão: Pacientes idosos, com diagnóstico de câncer, e aqueles internados por motivos clínicos apresentam maior risco de deterioração clínica na UTI. O desfecho clínico de óbito foi mais frequente entre pacientes com escores NEWS 2 elevados.

DESCRITORES: Fatores de risco; Deterioração clínica; Unidades de terapia intensiva.

ABSTRACT

Objective: To evaluate the factors associated with clinical deterioration in patients admitted to the ICU. Method: Observational, quantitative study, carried out in 120 medical records of patients admitted between July and October 2023. For data collection, a sociodemographic and clinical characterization instrument and the NEWS 2 Scale were used. Statistical tests and a logistic regression model were applied, considering associations with p<0.05 as significant. Results: Factors such as advanced age (OR=6.9; 95%CI 1.78-26.7), cancer (OR=2.52; 95%CI 0.98-6.43), clinical hospitalization (OR=4.08; 95%CI 1.39-11.95), and death (OR=16.42; 95%CI 2.13-126.7) were associated with high NEWS 2 scores. Conclusion: Elderly patients, those diagnosed with cancer, and those hospitalized for clinical reasons have a higher risk of clinical deterioration in the ICU. The clinical outcome of death was more frequent among patients with high NEWS 2 scores.

DESCRIPTORS: Risk factors; Clinical deterioration; Intensive care units.

RESUMEN

Objetivo: Evaluar factores asociados al deterioro clínico en pacientes ingresados ​​en UCI. Método: Estudio observacional, cuantitativo, realizado sobre 120 historias clínicas de pacientes ingresados ​​entre julio y octubre de 2023. Para la recolección de datos se utilizó un instrumento de caracterización sociodemográfica y clínica y se aplicaron pruebas estadísticas y un modelo de regresión logística, considerándose significativas las asociaciones con p<0,05. Resultados: Factores como la edad avanzada (OR=6,9; IC95% 1,78-26,7), el cáncer (OR=2,52; IC95% 0,98-6,43), la hospitalización clínica (OR=4,08; IC95% 1,39-11,95) y el resultado de muerte (OR=16,42; IC95% 2,13-126,7) se asociaron con puntuaciones altas en NEWS. 2. Conclusión: Los pacientes ancianos, diagnosticados con cáncer y aquellos hospitalizados por motivos clínicos tienen mayor riesgo de deterioro clínico en la UCI. El resultado clínico de muerte fue más frecuente entre los pacientes con puntuaciones altas en NEWS 2.

DESCRIPTORES: Factores de riesgo; Deterioro clínico; Unidades de cuidados intensivos

INTRODUÇÃO

A Unidade de Terapia Intensiva (UTI) oferece cuidados de alta complexidade com uma equipe multidisciplinar, onde da admissão à alta, é avaliado o estado clínico do paciente, considerando o risco de agravamento. Nesse contexto, a deterioração clínica é caracterizada por alterações nos dados vitais, associadas a fatores subjetivos e objetivos. O reconhecimento precoce dessa deterioração, com medições e interpretações adequadas, pode permitir intervenção rápida e prevenir eventos mais graves. Assim, foram desenvolvidos sistemas de pontuação para identificar os pacientes que necessitam de monitoramento em UTI , devido à limitação de recursos(1).

A escala National Early Warning Score (NEWS 2) é uma ferramenta britânica desenvolvida pelo Royal College of Physicians (RCP) para identificar precocemente pacientes em deterioração clínica. A escala é mais sensível para descartar pacientes de alto risco e possui melhor poder preditivo. Ela é usada na admissão, internação e no período pré-hospitalar, sendo calculada com base em parâmetros fisiológicos e no uso de oxigênio suplementar. Por ser de fácil acesso e interpretação, a NEWS 2 foi adaptada para o português brasileiro(2).

O papel do enfermeiro no reconhecimento precoce das alterações é de extrema importância. A aplicação da escala e interpretação dos dados, culmina com a tomada de decisão para a seleção das suas intervenções, já que o resultado de escore aponta para a necessidade de cuidados de acordo com a clínica.(3).

A avaliação de enfermagem é essencial para determinar a condição do paciente e fundamental para identificar riscos. Quando baseada em instrumentos como escalas, possibilita decisões mais eficazes, impactando positivamente o prognóstico. Além disso, a utilização de escalas embasa cientificamente o cuidado da enfermagem global, tornando a prática mais rigorosa e referenciada(3). Diante desse contexto, o objetivo deste estudo foi avaliar os fatores associados à deterioração clínica em pacientes admitidos na UTI.

MÉTODO

Trata-se de um estudo observacional, quantitativo, realizado na UTI de um  hospital universitário localizado no estado de Pernambuco. O setor é composto por dez leitos, disponíveis para admissão clínica e cirúrgica. 

A coleta de dados ocorreu no período de julho a agosto de 2024, através da análise de prontuários de pacientes admitidos no período de julho a outubro de 2023. A amostra foi do tipo censitária, sendo incluídos 120 pacientes conforme critérios de elegibilidade indicados pela escala NEWS 2: indivíduos acima de 18 anos, ausência de gestação, de cuidados de fim de vida e de lesão medular(2). Pacientes com registros incompletos de sinais vitais também foram excluídos por impossibilitar a aplicação da escala.

Foram coletadas informações sociodemográficas e clínicas referentes ao momento da admissão do paciente na UTI, tais como sexo, idade, tipo de internação, comorbidades, motivos da internação e desfecho clínico (alta ou óbito). Para classificação do risco de deterioração clínica foi utilizada a escala NEWS 2, a qual é composta pelas variáveis: pressão arterial sistólica (PAS), frequência cardíaca (FC), frequência respiratória (FR), saturação periférica de oxigênio (SPO2), temperatura, nível de consciência e uso de oxigênio suplementar. Ao final da aplicação da escala foi possível categorizar os pacientes em: baixo risco (1 a 4 pontos), risco baixo-moderado (3 em um único parâmetro), risco moderado (5 a 6 pontos) e risco alto (≥7 pontos).

Análises estatísticas descritivas e inferenciais foram realizadas utilizando o software Stata/IC 16.0. Para análise de associação utilizou-se o teste Qui-quadrado e Exato de Fisher, sendo consideradas como estatisticamente significantes as análises com p<0,05. Também foi realizada análise de regressão logística para estimar a razão de chance (OR, IC95%) para ocorrência do escore NEWS 2, classificado em baixo/baixo-médio ou médio/alto, nas características sociodemográficas e clínicas dos pacientes.

O estudo atendeu aos aspectos éticos preconizados na Resolução 466/2012, do  Conselho  Nacional  de  Saúde,  sendo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital das Clínicas vinculado à Universidade Federal de Pernambuco, sob CAEE nº78105724.7.0000.8807.

RESULTADO

Dos 120 pacientes admitidos na UTI, a faixa etária mais prevalente foi entre 40 a 59 anos (n= 40; 33,33%) e o sexo predominante foi o feminino (n= 64; 53,33%). A distribuição da classificação do escore NEWS 2 demonstrou que 43,33% (n=52) dos pacientes apresentaram escore alto, 26,67% (n= 32) médio,  7,5% (n= 9) baixo-médio e 22,5% (n= 27) baixo.

Ao analisar a relação entre o escore NEWS 2 e as características sociodemográficas e clínicas, observou-se a associação estatisticamente significativa entre câncer (CA) e NEWS 2 (p=0,015) e desfecho clínico e NEWS 2 (p=0,012). Em ambos os grupos, a prevalência foi de um escore de admissão classificado como risco alto para deterioração clínica, com 64,71% e 66,67% respectivamente (Tabela 1).

Tabela 1 Associação entre as características sociodemográficas e clínicas e a classificação do escore NEWS (N=120), Recife-Pernambuco, Brasil, 2024.

‖ Teste exato de Fisher. † Teste qui-quadrado.

A análise de regressão logística identificou que fatores como idade avançada entre 60 a 69 anos (OR = 6,9; IC 95% 1,78 - 26,7), internação clínica (OR = 4,08; IC 95% 1,39 - 11,95), diagnóstico de câncer (OR = 2,52; IC 95% 0,98 - 6,43) e desfecho de óbito (OR = 16,42; IC 95% 2,13 - 126,7) foram significativamente associados a escores elevados no NEWS 2. Variáveis como sexo, presença de hipertensão arterial sistêmica (HAS), diabetes mellitus (DM), sepse e choque indeterminado não apresentaram associação estatisticamente significativa com escores elevados do NEWS 2 (p > 0,05) (Tabela 2).

Tabela 2 Razão de chance da associação entre as características sociodemográficas e clínicas e classificação do escore NEWS (N=120), Recife-Pernambuco, Brasil, 2024.

‖ Teste exato de Fisher. † Teste qui-quadrado.

DISCUSSÃO

Os achados revelaram associações entre as características sociodemográficas e clínicas de pacientes internados em UTI com o escore da NEWS 2. Os pacientes do sexo feminino apresentaram maior prevalência de escores de risco médio e alto para deterioração clínica. Isso sugere maior vulnerabilidade, na qual fatores biológicos e sociais podem contribuir para o aumento do risco de deterioração, como alterações hormonais durante a menopausa, que contribui para dislipidemias aumentando o risco cardiovascular (4).

Embora a população predominante no estudo tenha entre 40 e 59 anos, a idade acima de 60 anos, apresentou maior risco de deterioração clínica, conforme valor do escore.  A idade tem sido revelada como fator importante para deterioração clínica segundo a NEWS 2. Estudo sugere que quanto maior a idade, maior o risco e que em situações de maior gravidade, como na pandemia de COVID-19, os idosos foram os mais afetados. Isso reforça a importância do monitoramento rigoroso e contínuo em pacientes idosos para prevenir a progressão clínica desfavorável (5).

A procedência da internação por motivo clínico, tais como choque e/ou sepse, bem como cirurgias de urgência, foram associados a escores elevados para deterioração clínica. Pacientes clínicos tem maior chance de escores altos em comparação aos de internação cirúrgica. A literatura aponta que um terço dos leitos de UTI são ocupados por pacientes com sepse grave e choque séptico, apresentando letalidade global de 55% (6).

Entre as comorbidades, pacientes com diagnóstico de CA mostraram maior valor de escore e chance de deterioração clínica. Esses resultados reforçam estudos que destacam pacientes oncológicos apresentando maior gravidade clínica, tempo de intubação e internação conforme o aumento do escore NEWS (7).

Quanto ao desfecho clínico, o resultado apresenta, com significância estatística, que os pacientes que evoluíram para óbito, obtiveram escore alto para deterioração. Essa apuração concorda com outros estudos, onde é comprovada a proporcionalidade entre maior escore e maior gravidade(8).

Ao traçar esses fatores, a equipe de enfermagem pode estruturar a assistência  dentro da lógica de risco, de maneira individualizada, contribuindo para melhor decisão no cuidado ao paciente com sinais de piora. Como exposto por estudo, que exibe o cuidado de enfermagem como significativo para menor taxa de complicações e morte hospitalar de paciente com câncer de bexiga(9).

Como limitação do estudo, destaca-se o fato de ter sido realizado em uma única instituição de saúde, que pode restringir a generalização dos achados. Além disso, o pequeno número de eventos relacionados a condições específicas, como sepse e choque, pode ter subestimado associações relevantes.

CONCLUSÃO

O estudo evidenciou que pacientes idosos, com diagnóstico de câncer, e aqueles internados por motivos clínicos apresentaram maior risco de deterioração clínica na UTI. O desfecho clínico de óbito foi mais frequente entre pacientes com escores NEWS 2 elevados. O impacto destes achados para a enfermagem global reside principalmente na contribuição para o aprimoramento da vigilância em saúde e do reconhecimento precoce de deterioração clínica em pacientes críticos.

Recomenda-se a realização de estudos sobre o efeito da NEWS 2, analisando seu impacto no monitoramento e tomada de decisão em saúde. Estudos multicêntricos com maior diversidade de pacientes e condições clínicas são necessários para confirmar e ampliar os resultados.

REFERÊNCIAS

1. Miranda J de OF, Camargo CL de, Nascimento Sobrinho CL, Portela DS, Pinho P de S, Oliveira T de L. FACTORS ASSOCIATED WITH THE CLINICAL DETERIORATION RECOGNIZED BY AN EARLY WARNING PEDIATRIC SCORE. Texto & Contexto - Enfermagem. 2020;29. Available from: https://www.scielo.br/j/tce/a/8wwxZXyNVLWnNK9w538Bhwp/abstract/?lang=pt.

‌

2.Oliveira APA de, Urbanetto J de S, Caregnato RCA. National Early Warning Score 2: transcultural adaptation to Brazilian Portuguese. Revista Gaúcha de Enfermagem. 2020;41.Avaiblable from: https://www.scielo.br/j/rgenf/a/Wc46R8wyJdLrGyffZQQQCcw/?format=pdf&lang=pt.

3.Dresser S, Teel C, Peltzer J. Frontline Nurses’ clinical judgment in recognizing, understanding, and responding to patient deterioration: A qualitative study. International Journal of Nursing Studies. 2023 Jan;139(1):104436. Available from: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/36731308/.

4.Fonseca MIH, de Almeida-Pititto B, Bensenor IM, Toth PP, Jones SR, Blaha MJ, et al. Changes in lipoprotein subfractions following menopause in the Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil). Maturitas. 2019 Dec;130:32–7. Available from: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/31706433/.

5. Simushev AA, Medvedeva EYu, Shulpekova YuO, Nechaev VM, Skhirtladze MR, Popova IR, et al. Reassessment of disease severity routine laboratory tests in the COVID-19 infection. Russian Journal of Gastroenterology, Hepatology, Coloproctology. 2022 Mar 7;31(6):16–22. doi:10.22416/1382-4376-2021-31-6-16-22.

6. Vista do Análise de tendência de mortalidade por sepse no Brasil e por regiões de 2010 a 2019 [Internet]. Revistas.usp.br. 2022 [cited 2025 Mar 24]. Available from: https://www.revistas.usp.br/rsp/article/view/197372/181704.

7. Karabacak P, Bindal A, Turan İ, Erdemoglu E, Ceylan BG. The NEWS2 score predicts prolonged hospitalization in the intensive care unit in major surgery patients. Turkish Journal of Obstetrics and Gynecology [Internet]. 2023 Sep 1;20(3):179–83. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC10478721/.

8.Zhang K, Zhang X, Ding W, Xuan N, Tian B, Huang T, et al. The Prognostic Accuracy of National Early Warning Score 2 on Predicting Clinical Deterioration for Patients With COVID-19: A Systematic Review and Meta-Analysis. Frontiers in Medicine [Internet]. 2021 Jul 9 [cited 2021 Nov 29];8:699880. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC8298908/.

9. Gao Z, Fang L, Yin P, Deng Y, Pei M, Zhou T. Effects of Nursing Care for the Treatment of Patients with Bladder Cancer: A Systematic Review and Meta-analysis. Computational and mathematical methods in medicine [Internet]. 2022 Sep 25;2022:9554223. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC9527440/

‌